Assino embaixo. Admirável
Cristaldo, disse tudo.
L Valentin
A TELEVISÃO NACIONAL
E A HUMANA ESTUPIDEZ
Janer Cristaldo - cristaldo.blogspot.com.br
22/01/2012
Não. Não vou discutir a ridícula
história do suposto estupro ocorrido durante o tal de Big Brother Brasil.
Primeiro, porque não assisto à televisão nacional. Segundo, porque jamais
assistiria ao BBB. Certa vez, para saber do que se tratava, tentei ver o
programa. Não consegui agüentar cinco minutos. E o BBB, pelo que me consta, tem
milhões de espectadores. Haja pobreza mental neste país.
Vou discutir, isto sim, as
ridículas reações da imprensa ao ridículo programa. A última Veja, por exemplo,
deu capa e nada menos que oito páginas a um episódio que não merecia sequer
oito linhas. Pelos jornais, fico sabendo que, às seis da manhã de domingo
passado, numa emissão pay-per-view da Globo, um dos palhaços do reality show
teria estuprado, sob um edredom, uma outra idiota que dormia.
Duas considerações, para começar.
Primeiro, tanto estuprador como vítima negam o estupro. Que o estuprador negue,
entende-se. Mas se a vítima nega, então não há estupro algum. E portanto razão
nenhuma para esse alarido da imprensa. Em segundo lugar, é preciso ser muito
estúpido para pagar para ver um programa estúpido como aquele, às seis horas da
madrugada. Eu não o assistiria nem que me pagassem.
Tenho lido reclamações, tanto nos
jornais como na Internet, contra a televisão, contra a rede Globo, contra o
BBB. Não as entendo. O controle remoto tem dois botõezinhos, on e off. Basta
clicar no segundo e o telespectador está protegido de qualquer infâmia. Leio na
reportagem da Veja que a repercussão do programa no Twitter atingiu a marca de
116 mil tuiteiros. Ou seja, havia pelo menos 116 mil idiotas preocupados com o
BBB.
Desde há muito, há uma grita
geral contra o baixo nível da televisão nacional. Grita besta. Se você acha que
a televisão tem baixo nível, não a ligue. Ninguém é obrigado a assistir a
programas idiotas. Assiste porque quer. No fundo, parece existir a noção de um
certo direito a assistir TV, e neste certo direito vem embutida a noção de
assistir a bons programas. Ora, televisão precisa de público. Necessitando de
público, explora os baixos instintos deste público. Quem faz a televisão não
são seus programadores, mas essa gentinha que paga para ver idiotas se
esfregando sob lençóis às seis da madrugada.
A televisão criou um dos personagens mais
repelentes desta nossa era midiática, a tal de celebridade. Uma analfabeta
qualquer, desde que tenha algumas curvas, vira celebridade da noite para o dia,
porque a televisão quer. E por que a televisão quer? Porque sabe que se dirige
a um público de analfabetos, à gente que não lê, e que pede heróis do mesmo
nível de analfabetismo. Que ninguém se queixe. A televisão que existe no Brasil
é a televisão que os brasileiros querem. Diga-se o mesmo do governo. Que
ninguém pretenda programas inteligentes em um país que elege - e reelege - um
analfabeto para a Presidência da República.
Nunca tive boas relações com a
televisão. Até os trinta, o aparelhinho não existia em minha casa. Certa vez,
quando vivia em Porto Alegre, recebi a visita de moça muito linda, mas carente
de cérebro. Espantou-se com a nudez de meu apartamento. Não tens televisão?
Não, não tinha. Rádio? Muito menos. E carro? Também não. Então deves ser louco.
Talvez fosse, mas vivia muito em paz comigo mesmo, sem rádio, televisão ou
carro. Tinha, isto sim, livros. Mas isto pouco interessava à moça.
Só fui conhecer televisão em
Paris, em 77. Era correspondente de um jornal gaúcho. Embora falasse razoavelmente
o francês, precisava de mais intimidade com a língua e com a política nacional.
A televisão então me pareceu ser útil. Mais ainda, tinha alguns programas
interessantes, como o de Bernard Pivot, que entrevistou em seu ofício mais de
oito mil escritores. Ano passado, fiz um despilfarro: comprei uma televisão de
56 polegadas. Eu a uso para ver filmes ou documentários. Mesmo na televisão a
cabo, não vislumbro muita vida inteligente.
Tenho um vício, é verdade, que já
confessei. É assistir aos pastores televisivos na madrugada. Mas é vício que me
informa sobre a incultura das gentes. Vivo em uma pequena bolha de amigos
cultos e, para conhecer a idiotice ambiente, nada melhor que vê-la concentrada
em templos no conforto de meu sofá. Dá muito trabalho sair de casa para ter uma
idéia da ignorância que me cerca.
Eu a contemplo então, perplexo,
na telinha. Milhares de pessoas, na madrugada, gastando tempo de descanso, para
ouvirem, extasiadas, vigaristas de baixo nível. Meus prediletos são Edir
Macedo, R.R. Soares, o apóstolo Valdemiro e a bispa Sonia Hernández. Aquela que
um dia disse: “gente, Deus é uma coisa quentinha”. Saiu de seis meses de prisão
nos Estados Unidos, por evasão de divisas, e retornou, olímpica, a seu
programa. Quatro ou cinco mil panacas a veneram cada noite em seu templo.
Penso que, neste sentido, a
televisão até que educa. É uma forma de tomarmos contato com a humana estupidez
sem sair de casa.
- Enviado por Janer @ 10:10 PM